
Quando D. João VI chegou ao Rio de Janeiro, em 1808, ficou surpreso ao ouvir a música sacra de José Maurício Nunes Garcia, tendo afirmado, segundo Taunay, que se espantava com a existência de “um músico desses em uma simples dependência de Portugal…”. Quanto a um outro gênero de música vocal, cantado nos salões e nas ruas, provavelmente o príncipe regente não deve ter se surpreendido: a modinha, que dominava no Brasil, já era cultivada também em Portugal. Esta canção de apelo sentimental, presença constante nas sociedades da colônia e da metrópole desde a segunda metade do século XVIII, desempenhava um considerável papel socializante, servindo para aproximar escravos e senhores.
Um outro gênero popular de canção no final do século XVIII, o lundu - originalmente uma dança africana - era igualmente apreciado nos salões cariocas e lisboetas. Os dois tipos de canção, que pertencem àquele campo de delicada definição - algo entre o popular e o erudito - são fundamentais para a música brasileira. A força da modinha fez com que continuasse a ser cultivada até nossos dias, tanto pelos chamados eruditos, como Camargo Guarnieri, Villa-Lobos e Cláudio Santoro, como também pelos melhores compositores da música popular brasileira, como Tom Jobim, Dorlval Caymmi e Chico Buarque.
Três dos mais destacados compositores cariocas de modinhas das primeiras décadas do século XIX estão presentes em nosso CD: Candido Ignacio da Silva, Gabriel Fernandes da Trindade e Joaquim Manoel da Camera. Ainda que fossem conhecidos e apreciados durante suas vidas, e que suas composições tenham sobrevivido, seja por edições impressas ou manuscritos preservados em bibliotecas, sabe-se muito pouco acerca de suas biografias.
(Marcelo Fagerlande, extraído do encarte)
Cândido Ignácio da Silva (1800-1838)
Lá no Largo da Sé (Lundu brasileiro)
Gabriel Fernandes da Trindade (c.1790-1854)
Batendo a linda plumagem
Joaquim Manoel Gago da Camera (Séc. XVIII)
Se queres saber a causa (poesia inspirada em Domingos Caldas Barbosa)
Estas lágrimas
Ouvi montes
Desde o dia em que eu nasci (poesia inspirada em Domingos Caldas Barbosa)
Vem cá minha companheira (poesia inspirada em Domingos Borges de Barros)
Nestes bosques
Anônimo
Si te adoro
Gabriel Fernandes da Trindade (c.1790-1854)
Graças aos ceos (Lundum)
Quando não posso avisar te
Joaquim Manoel Gago da Camera (Séc. XVIII)
Triste cousa
Foi o momento de ver-te
Cândido Ignácio da Silva (1800-1838)
Hum só tormento d’amor
Gabriel Fernandes da Trindade (c.1790-1854)
Erva mimoza do campo (poesia inspirada em Joaquim Antonio Magalhães)
Adorei hum’alma impura
Cândido Ignácio da Silva (1800-1838)
A hora que te não vejo (poesia inspirada em Magalhaens)
Joaquim Manoel Gago da Camera (Séc. XVIII)
Roxa saudade
Cândido Ignácio da Silva (1800-1838)
Quando as glórias que gosei
Busco a campina serena
Joaquim Manoel Gago da Camera (Séc. XVIII)
Porque me dises chorando
Modinhas Cariocas - 2007
Marcelo Fagerlande, direção e cravo construído por William Takahashi, São Paulo, SP, 1997; cópia de um original de Ioannes de Perticis, Itália, séc. XVII; um teclado, dois registros de 8′ e um registro de alaúde; temperamento desigual; diapasão: lá 3 = 438 Hz.
Luciana Costa e Silva, meio-soprano
Marcelo Coutinho, barítono
Paulo da Mata, flauta transversal, construída por Rudolf Tutz, Innsbruck, Áustria, 2004; cópia de um original de Wilhelm Liebel, Desdren, ca. 1830; instrumento de madeira (buxo), com dez chaves.
Marcus Ferrer, viola de arame construída por Barros, Volta Redonda, RJ, 2004; afinação Cebolão.
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